sábado, dezembro 03, 2005

 

Da imprensa...

«A gente não sabe quem ele [Cavaco] é. A gente não sabe como ele é. A gente não sabe o que ele pensa. A gente ouve o que ele diz mas a gente nunca sabe o que ele pensa, porque nunca sabe se o que ele diz é o que ele pensa, ou se é apenas o que ele pensa que é suposto dizer naquela circunstância. Nunca lhe sai nada espontâneo, que ele não deixa. Nunca se mostra ao natural, que ele não quer. Que pessoa é ele, afinal?
As pessoas comem, as pessoas bebem, as pessoas espirram e assoam-se, as pessoas enganam-se (e têm dúvidas), as pessoas tropeçam, as pessoas riem com gosto, as pessoas zangam-se, as pessoas contam uma graça, as pessoas nem sempre se aguentam geometricamente penteadas. Cavaco não. Cavaco, em público, não diz nem faz nada que possa assemelhá-lo aos seus semelhantes – que, por acaso, são pessoas. E se se distrai e faz (comer, por exemplo), fica em pânico – e os assessores por ele. Nunca vi ninguém mais formal quando tenta a informalidade. Se quer fazer de informal, e como é a fazer de conta porque nada daquilo é genuíno, sai ainda mais formal do que quando é formal… Soa tudo a falso. De Mário Soares, por exemplo, nós sabemos bem quem é e o que tem na cabeça – concordemos ou discordemos. Ele, sim, diz o que pensa, mesmo que nem sempre pense genial. E tem uma pessoa dentro, claro: sem que tenha vindo mal ao mundo, já o vimos comer (é, ele come), já o vimos rir, já o vimos ralhar, já o vimos com chapéus bizarros, já o vimos cometer gaffes, enfim, já o vimos homem. Conhecemo-lo, gostemos mais ou menos.»

Joaquim Fidalgo, Público, 30 de Novembro

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