quarta-feira, setembro 14, 2005

 

Erros meus, má fortuna...

“Errar é humano”. Diz-se com frequência. Geralmente como remate desassisado e conclusivo sobre algo irremediável ou não.
Não será um pleonasmo? Será que o macaco ou o leão erram?
Será que os bichos se enganam?
Será que as pulgas erram o salto? As aves, erram as rotas?
Errar é humano. Pois, o que haveria de ser?
Erra-se quando não atingimos o resultado esperado, o objectivo delineado? Quando construímos verdades, carreiras, relações, projectos de todas as latitudes - pessoais e profissionais – sob pressupostos falsos?
Ou será, simplesmente, a ilusão a culpada do erro? Logo nós, porque nos iludimos.
Não sei. Há quem culpe o coração, outros, a burrice. E o assunto arruma-se.
A primeira vez que tive a noção, clara, que errei e que o erro tinha punição, foi na escola primária. Com uma conta de dividir. Matemática.
Mais tarde percebi que havia, também, erros subjectivos. Daqueles que uma reguada não cataliza a solução correcta. Muito menos, a remedeia. Por volta dos 14 anos descobri os erros emocionais. Tipo, aqueles que cometemos tomados de paixão (assolapada), tão ou mais nociva do que o álcool e os seus efeitos aleatórios. Mas que, ainda hoje – porque nem sempre aprendemos com os erros – não troco por nenhum gim tónico bem servido!
No liceu, sim, acho que foi aí, descobri, claramente, os erros de interpretação.
“Não! O autor não queria dizer isso; o autor, blá, blá, blá.” E nós anotávamos o que o docente dizia sobre o que autor quis dizer. Para, por exemplo, não errarmos a pergunta do teste sobre “Folhas Caídas”, do Almeida Garrett. Tenho uma amiga que ainda hoje sofre por tudo o que os autores que estudou no liceu quiseram dizer e que ela nunca achou que fosse, realmente, aquilo que eles quiseram dizer. Enfim. Interpretações.
Acho que só aos 30 anos percebi que há erros, realmente, irremediáveis. Daqueles que não têm concerto e cuja solução é dizer, levianamente, “errar é humano”. Para que a possível culpa se desvaneça como que por magia. Ou então, como consolo tonto.
Errar é embaraçoso. Às vezes trágico. Outras vezes cómico.
Errar a porta de casa é embaraçoso e cómico. Morar num primeiro esquerdo e tentar abrir furiosa e insistentemente a porta do segundo esquerdo, até que nos perguntem porque estamos a tentar entrar numa casa que não é a nossa, é de fugir e nunca mais colocar os pés numa reunião de condomínio.
Errar numa teoria, por muito tempo que se ande enganado, o edifício científico sai enriquecido, porque está em permanente construção, porque, há quem o defenda afincadamente, é do erro que se volta a partir para a verdade. E aquele erro já foi uma verdade útil durante muitos anos, séculos, até. Devorei “O Erro de Descartes”, por exemplo. E dei graças a Manuel Damásio. È que sou do género: emociono-me, logo existo. Um horror!
Errar na nossa vida, pessoal ou profissional, pode ser trágico. Mesmo que daí, também se possa partir, novamente, para a “verdade”.
Será que quando se segue o coração se erra? Ou simplesmente se desacerta? Não acertar é menos pesado do que errar. De qualquer forma enganarmo-nos na porta de casa, por embaraçoso que seja, não será nunca comparável a desacertar com uma pessoa e/ou instituição.
Na matemática, diz-se do erro que é o valor absoluto da diferença (desvio) entre o valor exacto e o valor calculado ou registado por observação.
E na vida? Um desvio? Seguramente.
Entre muitos valores e uns tantos sonhos. Talvez.

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