sexta-feira, março 19, 2004

 

E agora as presidenciais...

1- Vi e arrepiei-me. Ao assistir à entrevista de Cavaco Silva na Sic senti-me a recuar no tempo. Eu sei que o "o homem" (como lhe chama Marcelo Rebelo de Sousa) tem qualidades e que a história acabará por lhe fazer justiça, mas é desconfortável pensar que atrás dele se perfilam os homens de fato escuro que fizeram do estertor do cavaquismo um período negro da nossa história recente. A sua candidatura (e ele quer, ele quer ser candidato) a PR tem um incómodo odor a naftalina.

2- O tabu, outra vez. Cavaco não aprendeu nada com os resultados desastrosos do primeiro tabu. E agora, quando o Governo é de novo social-democrata, vem dizer que avança para Belém se sentir que a situação política pode atingir um grau irreparável de de deterioração. No meio disto tudo, como fica Durão Barroso? Se Cavaco avançar, não será isto um sinal de que está a falhar como primeiro-ministro? E se Cavaco avançar e ganhar? Será que Durão quer ter em Belém a sombra incómoda do seu ex-chefe, um político com um perfil marcadamente executivo?

3- Durão Barroso, aliás, vai ter que ter muito tacto para lidar com este assunto das presidenciais. Ele sabe que nós sabemos que ele sabe que um eventual apoio do PSD a Santana Lopes deixará o partido em pantanas e "desgraduará" inevitavelmente a função presidencial. A amizade dele com Santana Lopes durará enquanto interessar aos dois. E a aliança com Paulo Portas durará enquanto servir o líder do CDS-PP, que necessita dos corredores do poder para sobreviver. Durão está como o tolo no meio da ponte: não sabe se há-de correr para os braços de Santana ou se há-de beijar a mão de Cavaco. Entre os dois venha o José Cid e escolha. E o primeiro-ministro ainda tem que se acautelar com as guinadas do seu parceiro da coligação. Ou vem por aí uma terceira via, ou Durão vai ter muitas dores de cabeça.

4- E, entretanto, no PS, espera-se por António Guterres. Se a candidatura de Cavaco cheira a naftalina, a de Guterres cheira a sacristia. Quando ele aparece na televisão a ajeitar a melena eu sinto vontade de puxar do revólver; quando o ouço falar de diálogo ou da teoria dos afectos sinto vontade de saltar de uma ponte. Ainda hoje tenho pesadelos em que Guterres surge como primeiro-ministro, a esfregar as mãos, beiço esticado, pés de pato virados para fora, o catecismo na ponta da língua. Eu sei que a eleição para Belém não deve ser encarada como uma recompensa. Mas pergunto: Guterres merece sentar-se no cadeirão da Presidência? Vade retro!

5- Um conselho ao PCP: por que não candidatam Odete Santos a Belém? A senhora tem mais lucidez, simpatia, garra e convicção do que o resto do Comité Central junto. Ia dar luta, barafustar, comover. Eu nunca votaria nela, mas admiro a coragem descomplexada com que todos os dias enfrenta o mundo.

6 - Bloco de Esquerda. Fernando Rosas outra vez, não! Please. Depois do cheiro a naftalina e a sacristia, só falta mesmo o odor enjoativo do cachimbo, que até está fora de moda. A esquerda deve ter um ar rijo, quase famélico, com músculo e nervo, e não uma versão pré-obesa do avô Cantigas. Antes o Loução de que semelhante tormento.

7- E o Manuel Monteiro? Pois vai proporcionar-nos bons momentos de humor, certamente.


|



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?