sexta-feira, março 05, 2004

 

Afinal, ainda blogo

Sinto-me como um político português: prometi e não cumpro. Tinha dito que não iria "blogar" durante uma semana, mas encontrei, aqui em Bissau, um sítio agradável para escrever, com uma ventoinha que gira no tecto criando uma brisa que vem em ondas. Mas tenho que me despachar, porque o Pedro Rosa Mendes (esse mesmo, o homem da Baía dos Tigres e da Visão) está aqui a chatear-me para usar o computador.
Faz calor em Bissau, claro. Quando chegámos o ar estava carregado de poeira por causa dos ventos sub-sarianos e havia uma luz extraordinária, quase fantasmagórica. A cidade é pequena, percorre-se a pé num par de horas e está naturalmente muito degradada, mas tem a dignidade das velhas damas que já conheceram dias de glória. Em algumas zonas ainda são visíveis as marcas dos conflitos recentes. Embora caiba toda num bairro de Maputo, Bissau fervilha com a campanha eleitoral, por todo o lado há cartazes e candidatos. Meia hora depois de chegar à cidade demos de cara com o Presidente da República. Só ainda não vimos o Kumba Ialá, que permanece em prisão domiciliária.
Comi hoje uns amendoins fantásticos, pequenos, picantes, como só existem em África, à sombra de umas mangueiras frondosas. Ainda não é a época das mangas, mas as árvores estão carregadas de promessas e de frutos. Comi também um extraordinário peixe grelhado no restaurante Padeira e uma papaia simplesmente deliciosa. I love Africa. Gosto do cheiro, das cores, das pessoas. África devolve-me à infância. Melhor: África faz-me ter saudades de coisas que não conheci, mas que pressinto.
Sexta-feira à noite e quase não há carros nas ruas. Há algumas esplanadas a funcionar, pouca gente a passear nas ruas esburacadas, mas aqui, na residencial Coimbra (!), está-se bem, sob um caramanchão de flores. A única nota dissonante é a RTP Internacional que está a transmitir um debate com o inefável Gilberto Madaíl.
Amanhã bem cedo quero regressar ao porto, que hoje estava misterioso, com a maré vazia, envolto em nevoeiro e poeira. Lá para a tarde sigo para os Bijagós, mais precisamente para Orango, num barquito que parece de brincar. Vamos pelo rio, primeiro, a partir de Quinhamel, e depois é o mar aberto até à ilha mais distante. Vou então cumprir o voto de silêncio. Abraços

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